segunda-feira, 29 de julho de 2013
terça-feira, 9 de julho de 2013
ENTREVISTA COM "RENATA & RAFA" (NOVA ZELÂNDIA)
Esta nova entrevista tem o objetivo principal de despertar nas crianças e adolescentes, ou em todos que a lerem, um espírito de buscar seus sonhos, acreditar em seus ideais, perseverar nos estudos e compreender que o mundo é muito maior do que somente o que vemos ao nosso redor, ou nas telas dos computadores ou da TV. Aqui fica bem claro que, sem estudo, tudo isto se torna muito distante de nós. E com as oportunidades que existem no mundo de hoje, mesmo em nosso país que ainda luta muito por melhorias na educação, entre tantas outras necessidades, ainda é possível se esforçar, estudar, batalhar e chegar lá.
Renata e Rafael são dois jovens que nos provam isto nesta entrevista. A Renata eu a conheci ainda bem pequenina, quando morava em Jundiaí, bem como seus pais e seus irmãos. O Rafa conheci quando começou a namorá-la, também em Jundiaí. Ambos vieram de famílias humildes que, como a maioria de todos nós, precisaram lutar, batalhar, trabalhar dias e noites para ter um pouco mais de conforto na família, mas que souberam aproveitar cada oportunidade que surgiu, sonharam, se esforçaram, batalharam e alcançaram algo que, para um conformista, não passaria de um sonho. Vale realmente a pena conferir. Leiam, releiam, partilhem, compartilhem, comentem e até mesmo se inspirem no resumo desta história. Eles nos enviaram uma série de fotos, e foi extremamente difícil selecionar algumas para colocar aqui, afinal, uma é mais instigante, maravilhosa que a outra. Foi, até agora, a mais longa de todas as entrevistas deste blog, mas que não devem perder uma só palavra. Vocês verão isso no decorrer da entrevista. E para ajudar, se quiserem ver as fotos ampliadas, com maior detalhe, basta clicar sobre qualquer uma delas e vê-las uma por uma. Finalizando, é só clicar no "X" (canto superior direito da foto) e voltar para a entrevista.
Valdinei Fernandes
Acompanhem:
As marcações no mapa se referem ao BRASIL (esquerda) e a NOVA ZELÂNDIA (direita) - clique sobre o mapa para visualizar melhor |
Esta entrevista foi feita com os dois, então, para algumas perguntas haverão duas respostas. Nesse caso estarão identificadas quem foi que respondeu.
NOME COMPLETO: Rafael Uchida & Renata Urbano Uchida
NASCIMENTO: Rafael: 08/11/1979, em São Paulo/SP
Renata: 19/04/1985, em Jundiaí/SP
Casaram-se na Nova Zelândia, em 2011.
RESIDÊNCIA ATUAL: Auckland/Nova Zelândia
ESCOLARIDADE: Rafael: Superior Completo,
Engenheiro.
Renata: Superior Completo, Bióloga.
Blog: _Fale um pouco sobre você
(uma auto biografia resumida):
Rafael: Bom,
resumidamente, meu pai é japonês de nascimento, minha mãe diferentemente nasceu
no Brasil, mas é filha de imigrantes japoneses. Eu nasci e cresci em São Paulo, capital. Estudei em um colégio católico desde o ensino fundamental até o ensino
médio. Depois entrei na faculdade em Campinas (Unicamp) onde me formei em
engenharia de alimentos. No início de carreira trabalhei em uma pequena
indústria de água de coco e depois em uma empresa francesa de auditoria e
consultoria. Ao longo deste tempo conheci a Renata (a mulher mais maravilhosa
do mundo) e depois de muito pensar, decidimos vir a Nova Zelândia, a princípio apenas para aperfeiçoar o inglês, mas aqui chegando mudamos de planos e agora continuamos vivendo
neste país tão belo e ainda sem saber exatamente o que faremos mais para a
frente.
Renata:
Como a grande maioria da população brasileira, não sei muito bem quais são as
minhas origens. Sou natural de Jundiaí/SP, sou vegetariana, amo os animais e
sou defensora do meio ambiente. Sempre estudei em escola pública e quando mais
jovem tive que trabalhar muito para pagar minha faculdade. Sou formada em
Biologia e lecionei em escolas públicas e particulares durante o período de
estágio da faculdade.
Conheci o
Rafa quando ele foi auditar a empresa de alimentos que eu trabalhava. Ele era
uma pessoa legal e tinha planos similares aos meus.
A decisão
de virmos para a Nova Zelândia foi bem pensada e planejada e acredito que foi
uma das melhores coisas que já fizemos na vida!
Blog: _Há quanto tempo estão na
Nova Zelândia? Em que região estão morando? O que podem falar sobre esse país?
Rafael e Renata: Já faz
mais de 4 anos que estamos morando na Nova Zelândia, em uma cidade chamada
Auckland, que é a maior cidade daqui, seja em tamanho, seja em população.
É uma
cidade ao norte da Ilha Norte, pois a Nova Zelândia, basicamente, consiste em
duas grandes ilhas (Norte e Sul).
Sobre a
Nova Zelândia, ela faz parte do grupo chamado de países desenvolvidos, com
excelentes indicadores sociais como a 6° país no mundo com melhor Índice de
Desenvolvimento Humano (2013), ou o 1° colocado no mundo com o mais baixo
índice de percepção de corrupção (que diferença com o Brasil) o que faz daqui
um bom lugar para se viver, seguro, ainda não tão contaminado com a loucura do
padrão 24h para tudo das grandes metrópoles do Brasil, e gostamos muito daqui
apesar do frio (e olha que moramos em uma região das mais quentes do país).
Foto do casamento (realizado na Nova Zelândia) |
Blog: _O que os levou a viverem
essa experiência? Pretendem voltar ao Brasil?
Rafael e Renata: A
principal razão para termos escolhido a Nova Zelândia perante outras opções talvez
mais acessíveis, foi o fato de em 2009 ter sido o primeiro ano em que foi
possível os brasileiros obterem um visto chamado working holiday, em que é permitido vir, residir, estudar e
trabalhar legalmente aqui por um período de um ano. Há alguns requisitos a se
cumprirem, mas que não são rígidos (vale a pena pesquisar mais sobre se alguém
ficar interessado).
Após a obtenção do visto, a princípio a nossa ideia era vir
para cá e estudar inglês por um ano e depois voltarmos. Mas ao longo do ano de
2009, vimos que ainda havia mais sonhos a serem atingidos e mudamos de ideia e
aplicamos para o visto de trabalho pela empresa que ainda trabalho. Em 2011, obtivemos o visto de residência neo
zelandesa o que significa que podemos viver, estudar, trabalhar indefinitivamente
aqui o que abriu o horizonte de perspectivas que agora nos deixa em dúvida o
momento certo de voltarmos ao Brasil para sempre (o que acontecerá, mas sem
data prevista ainda).
Blog: _ Já que estamos focados especialmente nas crianças e adolescentes de uma escola, até mesmo como estímulo e incentivo, contem quais são seus maiores
sonhos, sua opção de carreira, seus estudos e seus projetos para o futuro?
Rafael: Retomando
o fato de sermos residentes neo zelandeses, isto permitiu que pudéssemos ter a
oportunidade de estudar aqui pagando o mesmo valor que um cidadão local. Então
no começo do ano passado eu iniciei o meu mestrado em engenharia pela
Universidade de Auckland, que pretendo terminar no final deste ano de 2013. Para 2014, esperar o que vai acontecer. Talvez mudar de emprego (pois
trabalho e estudo meio período).
Renata: Eu trabalho meio período como babá, diarista e professora eventual em uma pré
escola montessoriana e, no outro meio período, foco em meus estudos. No início deste ano iniciei pós-graduação em gestão ambiental e terminarei no final de 2014. Depois que me formar, eu e o Rafa desejamos ter nossos filhos.
Blog: _Pelo que já conversei com vocês, convivem com um grande grupo de brasileiros que também estão aí na Nova Zelândia. Saberiam dizer se a maioria pretende voltar para o Brasil ou acham que já adotaram a
Nova Zelândia?
Rafael: Dados (que
eu não confio), dizem que há cerca de 8.000 brasileiros em Auckland apenas, o
que é um pequeno número se comparado com a quantidade de imigrantes de outros
países aqui, como Inglaterra, China e Índia. Mas sim, conhecemos um bom número
de brasileiros por aqui, mas o perfil deles é variável, desde jovens estudantes
de classe média, média-alta, até adultos com filhos que procuram aqui a
oportunidade de uma vida diferente. Respondendo à sua pergunta, no fundo, a
grande maioria pretende, sim, voltar ao Brasil, uns mais cedo, outros mais tarde,
pois é perceptível um maior laço afetivo com familiares e amigos entre
brasileiros, se comparado com outras nações, como os ingleses por exemplo.
Blog: _Até pela curiosidade que sei causar uma entrevista desta, poderiam dizer como são os horários de
vocês no dia a dia? O que fazem no trabalho, nos dias de folga, entre outros?
Rafael: Pelo fato
daqui ser um país de população baixa e não extenso, o ritmo de vida é
diferente, mais pacato, e teoricamente menos estressante. Por exemplo, comércio
durante a semana funciona até às 17h, com exceção de quinta-feira em que as
lojas podem ficar abertas até as 21h. O meu horário de trabalho por exemplo, é
das 8h até as 16h, segunda e terça, com meia hora de almoço (paga). Eu acordo
ás 7h, saio de casa às 7h55 e chego ao trabalho em cinco minutos.
O restante da semana é reservado ao mestrado.
Eu trabalho em uma pequena indústria de comida mexicana e lido com a produção
em si, mão na massa, já que a empresa possui apenas 6 funcionários. É um trabalho tranquilo, o que é desejável
pois isso me ajuda a dedicar mais tempo pensando no mestrado. A Renata acorda
no mesmo horário que eu, porém trabalha as quartas e quintas, nos outros dias
da semana ela se dedica a pós graduação.
Nos dias de folga, eu e Renata vamos à igreja no
sábado de manhã. Nas tardes, normalmente, nos encontramos com amigos ou
passeamos, pois aqui há uma quantidade imensa de parques e praias (como podem conferir em algumas fotos), o que nos
permite ter uma boa qualidade de vida.
Aos domingos, aproveitamos para ficar
mais em casa e descansamos. Aqui é um excelente local para os amantes da
natureza, para uma vida mais calma, para quem prefere ir a um bom restaurante
em vez daqueles que preferem a agitação de uma grande cidade.
Blog: _Vocês aconselhariam os
jovens do ensino fundamental, especialmente os daqui desta escola, a viverem
essa experiência de intercâmbio? O que
eles precisam fazer, além de levar a sério os estudos, para viverem uma oportunidade
dessas?
Rafael: Para os
jovens que estão lendo esta entrevista, nós aconselhamos a planejar um dia viver
esta experiência no exterior. É muito recompensador e diria importante ter esta
convivência com outras culturas, outros povos, outros credos, pois nestas
diferenças se aprende a valorizar o que você é e ao mesmo tempo a valorizar ao
próximo já que é necessário conhecer as pessoas para poder apreciá-las.
Renata e Rafael acompanhados de seus pais que foram lá para o casamento. |
Quanto
a idade ou o tempo que eu consideramos ideal para o jovem poder viajar, a
resposta seria variável, pois depende muito do perfil de cada um, mas
basicamente, a resposta seria, quanto mais jovem e mais maduro melhor. Sei que
parece um paradoxo, a princípio, mas o que queremos dizer é que quanto mais nova
a pessoa viajar e fizer o intercâmbio, acreditamos ser melhor. Mas para isso deve estar madura em relação à vida, ou seja, deve ser uma pessoa determinada, consciente, batalhadora, saber discernir o suficiente para não se
deslumbrar com a experiência e vir a se perder com maus hábitos, más companhias
e tornando esta oportunidade um desperdício. Para isto é preciso uma boa postura nos estudos, se afastar das drogas, bebidas, prazeres sem fundamento, enfim, ser uma pessoa de bem, senão a viagem pode se tornar um verdadeiro desperdício e trazer sérias consequências desagradáveis. Não importa a classe social, se tiver essas boas qualidades, conseguirá.
Renata: Sentimos mesmo bastante falta do Brasil. Principalmente dos nossos familiares e amigos, claro, em primeiro lugar, mas, particularmente, da sensação de pertencimento, eu digo,
por mais que eu viva não sei quantos anos mais aqui, este local não é o nosso.
As pessoas ao nosso redor não viveram as experiências que vivemos. A língua, a
cultura, o clima tem a sua importância também.
E sentimos falta de três coisas
que não se acha por aqui, goiaba, caldo de cana e pamonha. De resto, com
relação à comida, dá se um jeito e consegue-se achar soluções que
satisfazem.
Blog: _Qual o fuso horário da
Nova Zelândia em relação ao Brasil?
Renata: O fuso
horário fora do horário de verão daqui e do Brasil é de 15 horas, ou seja,
quando é meia noite no Brasil, nós aqui estamos às 3h da tarde do dia seguinte. Para entenderem direitinho, no momento desta entrevista, aí no Brasil é sexta-feira, às 20 horas, enquanto aqui, na Nova Zelândia, já é 11 horas da manhã do sábado. Por isso que sempre vocês podem ver nos noticiários aí no Brasil, nos finais de ano, que o ano novo chega aqui na Nova Zelândia quando o Brasil ainda está às 09 horas da manhã do dia 31 de Dezembro. O ano novo aqui chega primeiro.
Blog: _Como se chama quem nasce
na Nova Zelândia? É um povo acolhedor? Qual o idioma mais falado aí? E o clima
nesse país?
Rafael: Quem
nasce na Nova Zelândia é chamado de neo zelandês em português, ou new zealander em inglês, mas no
dia-a-dia adota-se o nome de kiwi,
não a fruta que conhecemos no Brasil (que aqui se chama kiwifruit), mas devido ao pássaro símbolo do país, o kiwi. Há três
línguas oficiais aqui, o inglês (o mais falado), o maori (devido ao povo que
vivia aqui antes da colonização inglesa) e a linguagem de sinais Neo Zelandesa.
O clima
daqui é temperado, mas me referindo a Auckland, onde resido, varia entre 24°C como máxima em média no verão a até 8° como a mínima média
no inverno. Chove muito aqui, especialmente no inverno, e o clima é variável ao
longo do dia. Mas definitivamente mais frio que São Paulo capital.
Blog: _Como é a educação aí
nesse país? As crianças são educadas quando estão na escola? Existe muito
problema de drogas entre os jovens e adolescentes?
Rafael: É dada
muita importância à educação por aqui, as escolas públicas são boas, e de
acesso universal. A taxa de analfabetismo é extremamente baixa, e os índices de
educação publicadas pela ONU classifica o ensino na Nova Zelândia como um dos
melhores do mundo. Não se vê por aqui crianças nas ruas sem estudar, e mesmo as
famílias de classe baixa aqui possuem incentivos do governo que as permitem
terem seus filhos nas escolas. Mas mesmo aqui não se está imune aos problemas
com drogas, em especial a maconha. Uma das características daqui é que os
jovens ao completarem 16,18 anos são incentivados normalmente a saírem da casa
dos pais, e eles passam a morar com amigos e muitos, muitos mesmo se envolvem
com bebidas e drogas. Por este motivo mesmo que, numa pergunta anterior, recomendamos viajar para fora do Brasil aqueles que já têm uma postura mais
madura diante da vida, que saibam lidar com este tipo de ambiente, para nunca se envolver e saber o que é bom.
Blog: -Existe alguma pergunta
que não fiz e que gostaria de constar nesta entrevista?
Rafael: Gostaríamos
de retomar a parte de planejamento. Se algum dos leitores tem, (e nós achamos que
todos deveriam ter), o sonho de fazer um intercâmbio, seja para Nova Zelândia, seja para outro país que tiver oportunidade, planeje desde já, não importa se está concluindo os estudos ou se é mais jovem ainda. Comece já a ter esse sonho, acreditar nisso, focar nesse objetivo. Mas não fique só no sonho, estude, busque informações em sites confiáveis, se informe em escolas que tenham intercâmbio. Existem diversas formas de se fazer, sendo umas mais fáceis, outras mais trabalhosas. Mas
pesquisem na internet, conversem com quem já fez. Com certeza em sua cidade vocês saberão de pessoas que já viveram a experiência do intercâmbio, e verão que, mesmo estudantes
de famílias mais humildes tiveram tal oportunidade e que a falta de recursos
(especialmente financeiros) não seja o que o impeça de realizar tal sonho. Hoje isso é possível, mas não pode ter preguiça de estudar. Aquele aluno que vai à escola só para brincar, nunca vai conseguir uma experiência dessa, tenha certeza.
Para ter
uma boa ideia de como é aqui, deixamos este vídeo com o hino nacional da Nova
Zelândia, com filmagens da paisagem daqui e o início em maori (uma das línguas
oficiais daqui) para depois em inglês.
https://www.youtube.com/watch?v=j6qmdqvItkM
Blog: _Deixe uma mensagem para os
amigos deste blog!
Rafael e Renata: Esperamos que as informações aqui dadas sejam um incentivo para
virem para cá um dia. Um grande abraço a todos e até qualquer dia.
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Para atualizar esta entrevista postada no mês de julho/2013, postamos mais uma foto, recebida direta da Nova Zelândia neste mês de outubro/2013. Acompanhem abaixo:
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Para atualizar esta entrevista postada no mês de julho/2013, postamos mais uma foto, recebida direta da Nova Zelândia neste mês de outubro/2013. Acompanhem abaixo:
segunda-feira, 1 de julho de 2013
ENTREVISTA COM "JECA TATU"
É claro que esta entrevista tem algo de diferente, fictício, mas com um objetivo. Vale a pena ler...
Nos últimos dias, protestos e mais protestos
tomaram conta das ruas de muitas cidades em nosso país. Muitas mobilizações,
com certeza justas e até necessárias, outras um pouco exageradas. Algumas sem
fundamento e outras até apenas pelo modismo, mas a grande maioria com esta mensagem: "É HORA DE MUDAR... E MUDAR PARA MELHOR!".
Seguindo este desejo de mudança, esta entrevista lúdica traz uma menção ao direito de protestar, de reclamar, de reivindicar, e que se fez presente neste personagem, um ser que representou todo um povo esquecido pelos sistemas e governos de cidades, estados e país na época em que foi criado e que, infelizmente, ainda se faz presente na realidade de muitos brasileiros atualmente.
Estou falando daquela figura simples, humilde, ingênua, pobre, rúdico nos atos, pensamentos
e palavras, na vestimenta, no trabalho, na sensibilidade e na criação. Um ser
que vive praticamente isolado da sociedade moderna, num contexto arcaico do
universo rural, com raras experiências em áreas urbanas, sofrendo o descaso das
dificuldades geradas quando da necessidade de alimentos, remédios, educação e
conforto.
Caipira por opção, mas sofredor pelo esquecimento alheio, sofre de anemia, desnutrição, bicho-de-pé, entre outros problemas
sérios de saúde.
Ele é "Jeca Tatu", personagem do escritor Monteiro Lobato,
muito conhecido por suas histórias infanto-juvenis, as quais giram em torno dos
famosos personagens do Sítio do Picapau
Amarelo, tornou-se uma obra de cunho social, de natureza crítica e vem
para denunciar questões como o sério problema de saúde pública, educação e
financeira em que vive.
Este modelo do caipira não idealizado (presente no
livro Urupês
- da saga criada por Lobato para os adultos) um cidadão esquecido pelo governo, à
mercê de enfermidades que já não deveriam estar presentes em pleno século XXI,
à margem da sociedade, sem renda fixa, praticamente na miséria e num imenso atraso
cultural. Condição nada romântica para nós, que falamos de “boca cheia” que
temos cidadania, somos instruídos, temos cultura e sabemos lutar pelos nossos direitos,
mas também esquecemos desse brasileiro esquecido. A utopia dessa verdade se fez
presente nesta entrevista. Vale a pena acompanhar para refletir, afinal, como
afirmava Monteiro Lobato, “Jeca Tatu não é assim, ele está assim”, vitimado pelo
desprezo de um governo nada preocupado com esta camada social e excluído e
discriminado por uma camada social que não está nessa situação.
Valdinei Fernandes
PARA ISSO, IMAGINE ESSA FIGURA CHEGANDO EM NOSSA ESCOLA:
Jeca Tatu chegou como sempre foi, num andar simples, arrastado, olhar de aparência triste, respiração fraca, desleixado, com a barba pouco densa, pés descalços, grossos, calcanhares completamente rachados, roupa velha, remendada e não tão bem cheirosa, chapéu de palha e um cigarro de papel atrás da orelha esquerda, fala caipira, sempre acompanhado por um cachorrinho vira-lata, magro, peludo mas sempre abanando o rabo com jeito de feliz.
Ele chegou, sentou-se nos degraus da escada da escola, me aproximei dele e perguntei se podia fazer-lhe algumas perguntas. Ele olhou meio desconfiado e só acenou positivamente com a cabeça. Aí comecei a entrevista:
Blog: _Sr Jeca, em que dia, mês e ano o senhor nasceu?
Jeca Tatu: _”óia, fio”, sei não, mas dizem por aí que o ano foi 1914.
(O caboclo Jeca Tatu surgiu em 1914 num artigo escrito por Monteiro Lobato)
Blog: _O senhor sabe onde nasceu?
Jeca Tatu: _Só sei que foi “pras bandas” do Vale. (Vale do Paraíba)
Blog: _Percebo seus pés com a base toda rachada como se nunca tivesse calçado um sapato. O senhor anda sempre descalço?
Jeca Tatu: Detesto “carça” sapatos. Isso é pra gente chique.
Blog: _O senhor tem estudo?
Jeca Tatu: _Tenho o estudo que a vida me dá. Conheço algumas palavras, todas vogais, os números só na cabeça, mas sei bastante prá não ser enganado.
Blog: _Sei que vive na roça e nunca trabalhou pros outros. Mas sei que tem uma terrinha bem pequena. O que faz para viver?
Jeca Tatu: _Tenho alguns canteiros de verduras, tenho bananeira, goiabeira, umas galinhas e dois porquinhos. Dá pra eu sobreviver. Perto de casa tem um pequeno riacho com poucos peixes. Tá bom demais.
Blog: _Dizem por aí que o senhor é preguiçoso e alcoólatra. É verdade?
Jeca Tatu: _Nunca trabalhei pra ninguém. Não saio de casa. Eu planto as sementes e elas crescem sozinhas, eu fico olhando sentado num banco, as vezes numa rede, as vezes no chão e as vezes tomando minha cachaça. Isso é preguiça e alcoolismo?
Blog: _O senhor era muito magro e tinha uma cor meio amarelada. Parece que está melhor. Tem problema sério de saúde?
Jeca Tatu: _Já tive. Tinha também muita dor no corpo. O médico que passou lá disse que eu tinha “o famoso amarelão”. Mandou eu usar sapatos e tomar remédios pra vermes. Mandou eu filtrar minha água, não nadar no rio e nem ficar abraçando meus animais. Mandou eu dar vacina neles e de vez em quando passa um pessoal lá em casa pra me lembrar de tudo isso. Eu levei a sério, e até uso sapato e tomo remédio. Mas quando esquecem de mim, eu esqueço de me cuidar também. Quando lembram, eu relembro e melhoro. Hoje tô descalço porque tô sentado aqui, mas uso calçado todo dia, sim.
Blog: _O que o senhor acha de tudo isso?
Jeca Tatu: _Acho que coisas simples mudaram minha saúde. Então todo mundo pode fazer igual. Aí eu coloquei sapato até nas minhas galinhas e nos meus porcos, mas eles parece que não gostaram muito não.
Blog: _Qual o maior orgulho de sua história de vida que gostaria de lembrar nesta entrevista?
Jeca Tatu: É muito simples. Minha imagem de um cidadão abandonado pelo Estado, deixado à mercê de enfermidades típicas de lugares esquecidos na miséria e no atraso econômico, pode ser mudada com gestos simples, bastando apenas uma boa vontade do governo e de todos que me conheciam. Meu maior orgulho foi que, minha história, criada por Monteiro Lobato, felizmente, usando esta imagem de um homem sofrido e esquecido, serviu como um instrumento em operações de esclarecimento sobre a importância do saneamento básico e público nos anos de 1919 e 1920 principalmente. Com esse alerta sobre a urgência em erradicar doenças como o amarelão, que na época matava tantas pessoas, minha imagem serviu para acordar até o governo, e por isso que me cuidei e melhorei também.
Blog: _E que mensagem o senhor pode nos deixar de tudo isso, principalmente nestes dias que tantos protestos eclodem pelo país afora?
Jeca Tatu:_ Que podemos protestar sim. Podemos e devemos, mas devemos ser criativos e pacíficos, sempre. Vejam que, no caso de Monteiro Lobato, criar meu personagem com uma história inspirada na situação de brasileiros ajudou a mudar essa realidade no ano de 1920. Isso não é só motivo de orgulho por ser famoso, mas principalmente por ter ajudado o governo tomar consciência e mudar um rumo em algo de bom na vida de parte do povo brasileiro. Será que o jovem de hoje consegue ser tão revolucionário mas ao mesmo tempo criativo e pacífico em suas manifestações como foi meu pai Monteiro Lobato?
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